E ele desatou a escrever. As palavras lhe fluíam como bolas de sabão pairadas ao vento. Escolheu o papel por ser o único instrumento em forma de matéria que aceite qualquer objecção sem replicar ou oferecer protesto como resposta. Tinha também pensado em anjos ou algo de carácter extraordinário, mas determinou a si mesmo que não acreditaria nestas essências. Ela abusava da sensatez, da moral e de uma supremacia. Possuía idéias arrojadas, padrões concretos, recheados de uma inquietação sem fim. Acreditava em índule e brandura, mas já não era tão afável como antigamente. Apresentavam a destreza dos que querem bem - ele se esquecia de ponderar, ela se esquecia de tolerar. Possuíam entre si amor e diligência, qualidade de quem é terno - ele era irrelevante, ela era previsível. Compartilhavam de memórias e prazeres - ele era raso e ela inadequada. Ele passou a acreditar que não era estimado - insolência. Ela jurou que o protegeria do mundo - arrogância. Para ambos foi restado: escrúpulo, incerteza e suspeita - atributos de quem se inclina sem hesitação ao amor.
terça-feira
Ás vezes acho difícil viver de despretensão. Parece que aos poucos, tudo o que é sempre cuidadosamente pensado e escolhido resolve por vontade própria nos passar a perna. Não há planos que garantem uma execusão perfeita do começo ao fim, mas quando algo insiste em persistir em seu modo torto, talvez seja a hora do despretensioso se atentar ao seu caminho. Tudo o que é constantemente desejado traz consigo uma pontinha de febre torturante, que incita atitudes nem sempre cogitadas e muitas vezes indignas de um estar verdadeiro. Se pudesse hoje mudar o que já foi feito e contar baixinho tudo aquilo que desejo, premeditadamente não o faria, pois já não acredito em desejos sem propósitos definidos.
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